Organização e Luto

05:00

Perdi meu pai no último dia 21/05/21. Desde então tem sido um período difícil. Difícil de viver e de explicar. Altos e baixos, dias bons, dias ruins, dias bons que ficam ruins, dias ruins que ficam bons. Eu resolvi trazer esse assunto aqui porque não consigo ainda falar sobre outras coisas e porque com tantas mortes acontecendo no mundo, talvez minhas reflexões possam ajudar outras pessoas a lidar com esse momento usando a organização como ferramenta.

A Organização sempre me ajudou a lidar com o caos e é daí que vem o meu trabalho. O caos faz parte da vida e não existe vida sem caos. Não existe também vida sem organização e não existe caos sem organização. Mais do que uma reflexão filosófica, do caos é possível que a gente se reorganize. Meu pai sempre foi um exemplo pra mim, uma força, um porto seguro. Existir sem ele é ainda difícil de conceber. E no meio desse caos, a organização surge como uma possibilidade de seguir existindo.

Ela está presente nos meus hábitos (lembra que quando a gente se acostuma com algo aquilo acontece automaticamente?) e assim eu não preciso pensar no que preciso fazer e apenas faço. Acordo, tomo café, cuido da minha filha, faço Pilates, tomo banho, sento na mesa de trabalho. Se eu tivesse que tomar essas decisões a cada instante provavelmente continuaria na cama nos dias piores.

A organização está presente também nos meus controles e agendamentos. O celular me lembra o que é importante e eu sei exatamente onde encontrar o que eu preciso para realizar o que quer que seja. O esforço é mínimo hoje em dia (claro que pra isso eu tive que investir tempo, estudar, e otimizar aos poucos a partir da auto-observação, nada vem assim fácil) e isso me conforta. Ver que eu consegui realizar minimamente o que era possível me alivia o peso.

Esse é o lance com o luto. Ele torna o esforço de qualquer atividade mil vezes maior. Te faz se questionar a todo instante se vale a pena dar o próximo passo. E se a coisa já não está bem internalizada, é ainda mais difícil.

E isso não significa que todos os dias são assim e eu faço o que havia planejado, o que é importante, o que precisa ser feito. Tem dias que o menor esforço é puxado demais pra mim. Física, mental ou emocionalmente. Nesses dias eu me permito respeitar meus limites e me acolher. Respiro fundo e penso no que eu preciso...um cochilo? Um banho? Um livro? Olhar as fotos do passado, ouvir sua voz em um áudio perdido no celular? Um abraço do marido? Um joguinho no celular ou filminho com a filha? Uma volta no Aterro?

Quando a gente reduz a culpa e para de se forçar para além do que é possível, a vida se torna possível, um dia de cada vez. Tem dia que só de abrir o computador e ver a planilha com as ações do inventário organizadas eu já respiro de alívio. Tem dias que receber a mensagem do advogado sobre os documentos pendentes faz o coração bater mais forte de ansiedade. E é assim, um dia de cada vez, me agarrando na organização, que vou fazendo o que é possível, calculando os impactos, recolhendo os cacos e me reorganizando.

Nada mais vai ser como antes. Perder quem te colocou no mundo é uma dor que não tem como sarar. Mas saber que ele está em mim, nas minhas irmãs e irmãos e em tudo que ele nos ensinou faz valer a pena. Ele tinha orgulho de mim e eu tenho muito orgulho dele. Isso não vai mudar.

Disso tudo vão surgir mais vários aprendizados, como tudo nessa vida. Aprendizados sobre a vida, a morte, o que realmente importa e o que não faz a menor diferença. Ninguém se prepara pro luto, mas é possível vivê-lo sem se perder. Eu sigo por aqui, um passo de cada vez. E se você tiver paciência, tenho ainda muito a compartilhar e aprender nessa troca linda que a gente tem por aqui.

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2 comentários

  1. Meus sentimentos Alice, não tenho palavras para expressar mas desejo forças para vocês. Tudo no seu tempo, o que ficam são as boas lembranças e ensinamentos que deixou em cada um. Um abraço virtual mas como se fosse real e apertado. <3

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